segunda-feira, 21 de abril de 2008

Jardim, Cavaco e a Democracia

AO CABO DE TRÊS DÉCADAS de condescendência, complacência e pusilanimidade confrangedoras, por parte da maioria dos dirigentes políticos nacionais e dos titulares dos órgãos de soberania da República, já é demasiado tarde para pôr na ordem Alberto João Jardim e obrigar o truão cesarista e telepopulista que governa a Madeira a respeitar os seus adversários políticos e as instituições representativas do Estado democrático.
O sentimento de total impunidade de que Jardim beneficia, no arquipélago em que vive politicamente entrincheirado, é que lhe dá alento para a demagogia e o insulto, a provocação e a chantagem permanentes, a intolerância para com os adversários e o total desprezo pelas instituições democráticas, que ele curto-circuita sistematicamente.
Como todo o cesarista que se preza, Alberto João Jardim continua a alimentar a ambição ilegítima de exercer o poder sem limites, de governar sem oposição e de impor a sua vontade política abafando as vozes dos que discordam e liquidando a democracia representativa. Como é um truão telegénico, grande comediante da era da vídeo-política, não hesita em utilizar a televisão para praticar a demagogia e multiplicar as provocações e as chantagens, as ameaças e os insultos. É um demagogo telepopulista e pós-fascista.
Jardim recorre frequentemente à palhaçada e à linguagem desbragada, por vezes pseudo-revolucionária e anti-capitalista, como armas políticas de arremesso, não apenas contra os «cubanos» e os «maçons» do continente mas, sobretudo, contra o sistema. Ele sabe como alimentar o sentimento de claustrofobia política insular, invocando ameaças e conspirações imaginárias e apontando a dedo o inimigo colonialista que espreita a sua oportunidade em Lisboa para reduzir a Madeira à mera condição de colónia ‘africana’.
Convém não subestimar Alberto João Jardim, mas também importa não temer o ‘bicho’. Quando ele ataca directamente a democracia representativa, chamando «bando de loucos» aos deputados da oposição no parlamento regional, está a ultrapassar, mais uma vez, todas as marcas. E a atitude mais adequada e corajosa não será, propriamente, a de dizer: «Não mexam no bicho, que ele morde!». Porque, obviamente, é dessa atitude que o ‘bicho’ está à espera, para continuar a ‘morder’ e a enxovalhar quem se agacha.
Foi com surpresa que vi o Presidente da República invocar o «direito de reserva» - não o «dever» mas o «direito», note-se! – para se eximir a uma condenação pública do comportamento antidemocrático de Jardim. Não se quis meter em sarilhos, metendo na ordem o truão que governa a Madeira. Fez mal. Tal como fez mal em aceitar que fosse suprimida a habitual sessão solene da Assembleia Legislativa, o órgão de representação democrática por excelência. Cavaco Silva confirma, assim, a suspeita, gerada enquanto foi Primeiro-Ministro, de que também não aprecia especialmente parlamentos. Há sinais que perturbam e este é um deles. É lamentável que Jardim continue a ser o último a rir.
«Sol» de 19 Abr 08

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